domingo, 15 de março de 2015

A Batalha de Saint Pierre - 2


It effectually turns the fortune of the day at that point.

Na sequência do post anterior apresentamos agora a tradução do relatório escrito pelo Tenente-General Sir William Stewart, comandante da 2ª divisão aliada, e enviado ao seu superior, o Tenente-General Sir Rowland Hill, que comandava o corpo aliado destacado na margem direita do rio Nive.
Sir William Stewart não esconde no seu relatório a importância do esforço das unidades portugueses durante todo o combate de Saint Pierre, elogiando a sua coragem e disciplina naquela ocasião dramática.

Tenente-General  Sir William Stewart para o Tenente-General Sir Rowland Hill
Petite Mouguerre, 14th December, 1813

(The Hon. Sir William Stewart)
Senhor,
Ao nascer do dia de ontem,  percebeu-se que o inimigo tinha concentrado as suas colunas na estrada de Bayonne, em frente do subúrbio de Saint Pierre. Às 8 da manhã o inimigo avançou com muita animação contra os nossos postos avançados colocados sobre aquela estrada. O centro da posição, que era interceptado pela estrada, tinha sido entregue à brigada portuguesa comandada pelo Brigadeiro General [Charles]Ashworth. O inimigo iniciou imediatamente um ataque determinado pela estrada e por ambos os lados dela, e ao mesmo tempo destacou uma grande força pela sua direita para aquela parte da posição central que repousava num regato de moinho e numa ravina que separava o centro da nossa esquerda, ocupada pela brigada do Major-General Pringle. O movimento do inimigo naquela direção foi rápido, e, se bem sucedido, teria separado aquela brigada do resto da 2ª divisão.
O inimigo, ao mesmo tempo ou um pouco depois, moveu a divisão Darmagnac contra a direita da posição, ocupada pela brigada do Major-General Bing, no alto e na vila de Vieux Mouguerre. O extremo direito desta posição repousava no Adour, enquanto a esquerda do Major-General Pringle se estendia até ao Nive. A extensão da frente assim ocupada pela 2ª divisão era quase de 4 milhas, os flancos estendendo-se em alturas, e o centro, de forma semicircular, possuía um carácter favorável à defesa. Todo o terreno ocupado é muito retalhado, com muitas casas dispersas, impróprio para os movimentos da cavalaria.
O objectivo do inimigo era forçar o nosso centro, ameaçar a esquerda e tomar posse firme da nossa direita. Esse objetivo, atingido em primeira ou última instância, (a altura de Vieux Mouguerre liga-se com a de Petit Mouguerre na retaguarda do centro) levaria necessariamente à retirada de toda a linha avançada. O ataque contra a brigada do Major General Pringle foi comparativamente mais fraco, e conduzido principalmente por tropas ligeiras. Assim que foi desencadeado o ataque sobre os postos avançados no centro, as companhias ligeiras da brigada do Major General Barnes avançaram para os apoiar e aquela brigada chegou logo após.
As colunas inimigas no centro, apesar de muito fustigadas pelos piquetes, conseguiram fazê-los recolher e estabeleceram-se numa crista intermediária entre a estrada e a esquerda do centro da posição.
(Batalha de Saint Pierre - 13 de Dezembro de 1813)

Nesse local e em algumas casas vizinhas, em ambos os lados da estrada, o combate durou algumas horas e com sucesso incerto. O regimento português nº 18 e a brigada do Major General Barnes empurraram repetidamente o inimigo de volta à sua posição inicial, e ele, por seu lado, graças ao número superior, da mesma forma obrigava as nossas tropas a retirar. Foram executadas algumas cargas brilhantes pelos portugueses e britânicos, particularmente pelo 92 Highlanders e o regimento português nº 18, galantemente dirigidas pelo Major General Barnes. Quatro peças da cavalaria a cavalo do Tenente-Coronel Ross e seis da artilharia portuguesa do Tenente-Coronel [Alexander] Tulloh foram usadas principalmente na defesa do centro, tendo sido muito habilmente dirigidas por aqueles zelosos oficiais. Enquanto a defesa das casas e da estrada estava a cargo do Major General Barnes, achei conveniente dar a minha atenção à esquerda do centro e preservar a comunicação com a posição do Major General Pringle. O regimento português nº 6 e o 6º de caçadores defendiam a esquerda do centro distinguindo-se bastante. O inimigo cresceu rapidamente em número e confiança que se tornou necessário retirar do centro o regimento 71 e duas peças da artilharia a cavalo e mais tarde duas companhias do regimento 92 para apoiar os portugueses. Sucessos vários continuaram. A superioridade numérica do inimigo permitiu-lhe, por volta do meio-dia, ganhar-nos o topo do terreno elevado assim como as cercas e casas vizinhas. A chegada da brigada da esquerda [da divisão] do Major-General [Carlos Frederico] Le Cor, comandada pelo General [Hipólito] Da Costa, foi oportuna. Dei ordem ao regimento nº 2 [português] para contornar a direita das colunas inimigas e logo depois, ao 14º [português] para recuperar o importante terreno que tínhamos perdido em frente. Ambos os movimentos, tal como todos os executados pelo nosso galante aliado na ação de ontem, foram feitos com grande espírito. A carga efetuada pelo regimento nº 14 [português], em coluna, através de uma cerca destruída e por uma estrada arborizada, foi liderada pelo Major Jacintho Travassos e teve a minha maior admiração. 
(Major General Carlos Frederico Lecor)
Efectivamente virou a roda da fortuna do dia naquele ponto. É meu dever recomendar à vossa atenção e à do Marechal Sir William Beresford, aquele corajoso oficial, que foi, segundo sei, gravemente ferido.
Enquanto a contenda continuava, conforme dito acima, no centro da posição, o inimigo depois de repelido voltou a empenhar tropas frescas no ataque, chegou, por vossa ordem, vindo da direita, o Major General Byng com o regimento 57 e um batalhão provisório, deixando o Buffs e as tropas ligeiras da sua brigada, comandadas pelo Tenente-Coronel Bunbury, para defender as alturas de Vieux Mouguerre. Apesar de este oficial ter sido, aparentemente, obrigado pela divisão Darmagnac a retirar para a retaguarda da posição, ao receber a vossa ordem para recuperar a povoação, o assalto foi executado com espírito, e o inimigo forçado a abandonar a altura, principalmente pelo empenho do Capitão Cameron (do Buffs): ele comandou as tropas ligeiras distinguindo-se muito, como em todas as ocasiões, e capturou um tenente-coronel e alguns «chasseurs» inimigos.
Até à uma hora da tarde viram-se os comandantes inimigos tentando lançar colunas frescas no ataque ao centro e essas colunas recusando avançar. Pareceu então oportuno fazer avançar a nossa direita, em frente da posição original do Major General Byng, e desapossar o inimigo de uma crista na qual ele tinha muitas forças e algumas peças com as quais incomodava o nosso centro. Ordenei ao Major General Byng para reunir a sua brigada do centro e a do alto de Vieux Mouguerre e atacar a crista. O movimento combinado foi executado com grande discernimento e coragem sob um fogo intenso por parte do inimigo. O Major General foi o primeiro a chegar o topo da colina com a bandeira do batalhão provisório nas mãos: o inimigo foi expulso da crista e empurrado para baixo para o subúrbio de St. Pierre, abandonando uma peça de 8 polegadas. O Major General louva calorosamente no seu relato o Tenente-Coronel Leith e o batalhão provisório pelo seu serviço. O inimigo fez um esforço mal planeado para retomar a posição, coberto por um forte bombardeamento de artilharia, mas a tentativa foi frustrada pela chegada da brigada portuguesa do Brigadeiro General Buchan em apoio do posto.
Na esquerda o Major General Pringle foi inicialmente atacado por tropas ligeiras e mais tarde de forma mais sólida. Manteve bem a sua posição e fazendo avançar a sua brigada para os postos avançados, já dentro do alcance do campo entrincheirado inimigo, contribuiu muito com este avanço para repelir o ataque feito contra a esquerda do nosso centro graças ao fogo de flanco feito pelo regimento 28. O Major General refere favoravelmente a conduta do Coronel Belson e daquele regimento. Tendo o Major General Barnes sido obrigado a abandonar o campo devido a duas feridas, o Brigadeiro General Ashworth retomou o comando do centro da posição, e com igual inteligência e espírito restabeleceu os seus postos avançados no terreno que tinha estado na posse dos do inimigo antes da ação, o qual, nesta altura, abandonou uma peça pequena.

(Attack on the road to Bayonne - Dec. 13th 1813 por A. Heath)
A linha avançada assim adquirida ao longo da nossa frente confirmou a vitória do dia.
Ao pôr-do-sol o inimigo retirou para o subúrbio de St. Pierre e o fogo cessou em ambos os lados.
A perda sofrida pela divisão sob o meu comando imediato [2ª divisão], num confronto tão desigual em termos dos números opostos, foi severa. A divisão teve que cumprir bem o seu dever de forma a manter-se no terreno ocupado inicialmente: graças ao apoio ativo e atempado que lhe enviou não foi necessário retirar daquele terreno; nem teria eu feito justiça às vossas disposições de ontem e dos dias precedentes se uma resistência menos firme do que a que ocorreu tivesse sido feita. O inimigo deve ter sofrido severamente dadas a tenacidade do seu ataque e a nossa posição dominante. Parece que nos opôs todo o seu exército, com exceção das duas divisões na margem esquerda do Nive, e uma mantida em reserva na nossa frente. Creio que o Marechal Soult comandou em pessoa.
A chegada da 6ª e depois da 3ª divisão trouxe ao corpo sob o meu comando um apoio valioso, já no fim da ação, que contribuiu muito para o nosso sucesso. Fico em divida particularmente aos Caçadores da 6ª divisão [batalhão nº 9] pela sua cooperação no ataque do Major-General Byng à crista avançada.
Não posso expressar tão calorosamente como deveria a minha aprovação dos generais e oficiais comandantes debaixo das minhas ordens. Dos primeiros, os Majores Generais Barnes e Byng e o Brigadeiro General [Charles]Ashworth distinguiram-se particularmente. Dos segundos, o Tenente-Coronel Cameron, 92 Highlanders, e o Major Gordon, regimento 50, que comandaram as tropas ligeiras do Major General Barnes, foram os mais destacados na minha primeira brigada. O tenente-coronel Leith, regimento 31, e o capitão Cameron dos Buffs na segunda brigada. O tenente-coronel [Maxwell] Grant, regimento português nº 6, que comandou primeiro aquele regimento e depois a brigada, apesar de gravemente ferido no terminar da ação; o tenente-coronel [Peter] Fearon, Caçadores nº 6, e o Capitão Borges [Manuel Pereira Borges], que comandou o regimento nº 18 depois da morte do Major José [Matias José de Sousa], na brigada portuguesa. O mérito do Major [Jacinto Alexandre] Travassos, do regimento português nº 14, foi já indicado por mim. Estou em divida, pelo importante apoio que me prestaram nos seus comandos, aos Majores Generais Pringle e [Carlos Frederico] Le Cor, aos Tenentes-Coronéis [Alexander] Tulloh e Ross e ao Major Jenkinson, da Real Artilharia Britânica, ao Major [João da] Cunha Preto da artilharia portuguesa, e ao capitão [Hugh] Lumley do regimento português nº 18.
Recebi muita assistência por parte dos meus ajudantes pessoais, todos eles feridos, enquanto estiveram no campo: pela quarta vez durante esta campanha aproveito  a oportunidade para chamar a vossa atenção e a do Comandante das Forças para o mérito do Capitão Thorn, Deputado-Assistente do Quartel-Mestre General.
Tenho a honra de incluir os nomes de alguns oficiais cuja a promoção, pelos seus serviços na ação de ontem, peço a vossa recomendação ao Marquês de Wellington.
Tenho a honra de ser, Senhor, um seu fiel servidor,

W. Stewart

Fonte: Supplementary Despatches, Correspondence, and Memoranda of Field Marshal Arthur, Duke of Wellington (...) Volume the Eight (...) London, 1861: p. 438-441.


sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Batalha de Saint Pierre

Passam hoje duzentos anos sobre o combate de Saint Pierre, o último de uma serie de ações que decorreram entre 9 e 13 de Dezembro de 1813, a sul de Bayonne,  já em França, e conhecidas pela designação de batalhas do Nive. 
Estas ações fizeram parte da  última ofensiva intentada pelo marechal Soult para travar o avanço do exército anglo-luso-espanhol comandado por Wellington e que terminou num rotundo fracasso.
Em Saint Pierre, um dos combates mais difíceis e sangrentos em que participou o exército português, os soldados portugueses demonstraram mais uma vez a sua coragem e determinação. Em sua homenagem publicamos hoje um registo das baixas sofridas e das promoções concedidas pela conduta no campo de batalha.

(Vista parcial do campo de batalha -à esquerda- a partir da Croix de Mouguerre. O rio Adour e a cidade de Bayonne ao fundo. Foto retirada daqui.)

Batalha de Saint Pierre

13 de Dezembro de 1813

Unidades do Exército Português Presentes

Divisão Portuguesa: Marechal de Campo Carlos Frederico Lecor

Baixas do Estado-maior: 3 oficias feridos
Marechal de Campo Carlos Frederico Lecor; Brigadeiro Carlos Ashworth; Tenente-coronel Alexandre Tulloh, comandante da artilharia portuguesa;

2ª Brigada: Brigadeiro António Hipólito da Costa

RI 2 (1062 homens) comandado pelo coronel Jorge de Avillez
Baixas: 19 praças mortos; 29 praças feridos; 6 praças extraviadas; Total 54
RI 14 (1059 homens) comandado pelo major Jacinto Alexandre Travassos depois pelo major Rodrigo Vitto Pereira da Silva
Baixas: 2 oficiais e 52 praças mortos; 4 oficiais e 68 praças feridos; 6 praças extraviadas; Total: 132
Oficiais mortos: major graduado em tenente-coronel Jacinto Alexandre Travassos e capitão Urbano Xavier Henriques;
Oficiais feridos: ajudante Thomaz Antonio da Guarda Cabreira; tenente Daniel Donovan; alferes João Lamprêa de Sarre; alferes José Cezario Peniz Parreira;

4ª Brigada: Brigadeiro João Buchan

RI 4 (1128 homens) comandado pelo tenente-coronel João Hill;
Baixas: 19 praças mortos; 3 oficias e 46 praças feridos; Total: 68
Oficiais feridos: capitão Angus McDonald; capitão Domingos Corrêa de Mesquita Cary; alferes Bernardino de Senna de Figueiredo;
RI 10 (1106 homens) comandado pelo coronel Luiz Maria de Souza Vahia;
No documento do AHM 1-14-57-12-1 diz-se que apesar de todo o  batalhão estar presente só combateram cinco companhias e um destacamento de 90 praças e refere ainda os oficiais comandantes dos destacamentos e companhias. No mesmo documento refere-se que o tenente-coronel Donald McNeill, deste regimento, comandou as companhias de granadeiros da brigada.
Baixas: 2 oficias e 12 praças mortos; 5 oficiais e 42 praças feridos; Total: 61
Oficiais mortos: capitão Luiz Manuel de Carvalho e tenente Antonio de Abreu;
Oficiais feridos: capitão Pedro Pinto de Moraes Sarmento; capitão Manuel Martiniano de Souza Girão; alferes Pedro Paulo Ferreira Passos; alferes Antonio de Padua Ferreira; alferes Antão de Sá Valente;
Caç  10 (273 homens) comandado pelo capitão graduado em major Francisco António Pamplona;
Baixas: 9 praças mortos; 6 oficias e 28 praças feridos; Total : 43
Oficiais feridos: capitão Frederico Armstrong; tenente Miguel Corrêa de Mesquita; tenente José de Souza Cirne; tenente José Maria de Souza; tenente José Allão Corrêa; alferes Antonio de Souza Cirne.

2ª Divisão Aliada: Tenente General William Stewart

5ª Brigada: Brigadeiro Carlos Ashworth

RI 6 (1019 homens) comandado pelo tenente-coronel Maxwell Grant;
Baixas: 1 oficial e 51 praças mortos; 8 oficiais e 132 praças feridos; 7 praças extraviadas; Total: 199
Oficiais mortos: capitão Manuel José de Pinho;
Oficiais feridos: tenente-coronel Maxwell Grant; ajudante graduado em capitão Manuel Joaquim Muniz; capitão João Joaquim Pereira do Lago; capitão João Pereira de Menezes; capitão Jorge Pheland; capitão João Sutherland; tenente Francisco José Sanhudo; alferes Manuel Antonio Pimentel;
RI 18 (1215 homens) comandado pelo major Mathias José de Sousa e depois pelo capitão Manuel Pereira Borges;
Baixas: 3 oficiais e 52 praças praças mortos; 4 oficias e 112 praças feridos; 11 extraviadas; Total: 182
Oficiais mortos: major Mathias José de Sousa e capitão Manuel Caetano de Sá Tinoco; capitão Tomaz Ridge;
Oficiais feridos: capitão Manuel Ferreira Aranha; capitão Hugh Lumley; tenente Luiz Carlos Appellius; alferes Joaquim Cezar de Araujo;
Caç 6 (557 homens) comandado pelo tenente-coronel Pedro Fearon
Baixas: 39 praças mortos; 3 oficias e 48 praças feridos; Total: 90
Oficias feridos: capitão Ricardo Brunton; capitão Guilherme Henrique Temple; alferes Melchior Pereira Coutinho;

6ª Divisão Aliada: Tenente General Henry Clinton

7ª Brigada: Coronel James Douglas

Caç  9 (376 homens) comandado pelo tenente-coronel Jorge Brown
Baixas: 2 praças mortos; 1 oficial e 12 praças feridos; Total: 15 (Oman)

Cristovão Aires dá as baixas de oficiais para toda a batalha do Nive onde Caç 9 combateu também no dia 9 de Dezembro no combate de Villefranque onde devem ter caído os oficiais indicados. Pela carta de Stewart para Beresford (publicada por Chaby) infere-se que o oficial ferido em St. Pierre foi o próprio comandante, o tenente-coronel Jorge Brown, sendo substituído no comando do batalhão pelo Major Luiz Maria de Cerqueira.

Artilharia

Comandante da artilharia portuguesa: tenente-coronel Alexandre Tulloh (RA 3)
1 brigada do RA 1 comandada pelo major João da Cunha Preto

No documento do AHM 1-14-57-12 ms 1 diz-se que depois de Tulloh ter sido ferido foi Cunha Preto que passou a comandar a artilharia.
Baixas: 6 praças feridos; (Oman)

Total da força de infantaria presente: 7795 homens
Total de baixas de infantaria: 844 homens (cerca de 11%)


(Foto retirada daqui)

Promoções pela boa conduta na batalha de dia 13 de Dezembro de 1813

Nota: Todos os sargentos foram promovidos a Alferes. Os oficiais foram graduados à patente imediatamente superior.
Divisão Portuguesa

2ª Brigada:
Infantaria nº 2:
Alf. Joaquim Carlos Viana; Sarg. Ajud. José Joaquim Furtado
Infantaria nº 14:
Maj. Jacinto Alexandre Travassos; Ten. Pedro Alexandrino Pereira; Alf. João Lamprea de Sárre; Alf. António Lobo da Silva

4ª Brigada:
Infantaria nº 4: Ten. Luís de Moura; 1.º Sarg. José Joaquim Pinto
Infantaria nº 10: Ajud. Alf. João dos Santos; Alf. Pedro Paulo Ferreira Passos
Caçadores nº 10: Cap. Frederico Armstrong; Ten. Miguel Correia de Mesquita; 1.º Sarg. José Belo de Araújo; 1.º Sarg. José Maria da Fonseca

2ª Divisão Aliada

5ª Brigada:
Infantaria nº 6: Maj. Manuel Luís Correia; Cap. José Cardoso de Carvalho; Alf. António Ferreira Borges; Alf. Manuel José Pimentel; 1.º Sarg . João Luís;
Infantaria nº 18: Cap. Manuel Pereira Borges; Cap. Hugh Lumley; Ten. Fernando de Magalhães; Ten. Luís Charles Appeluis; Alf. Joaquim Jerónimo da Cunha; Alf. Bernardino Coelho Soares; 2.º Sarg. Vitorino Vieira Borges;
Caçadores nº 6: Alf. Hernesto Augusto Brockhausen; Alf. Pedro Pinto de Araújo Correia; 1.º Sarg. João Manue l Bento;

6ª Divisão Aliada

Caçadores nº 9: Cap. Francisco Joaquim Pereira Valente; Ajud. Ten. André Simpson; Alf. Joaquim Manuel da Silva Rocha

Fontes:
Cristovão Aires, História Orgânica e Política do Exército Português
Charles Oman, A History of the Peninsular War, vol VII
Claudio Chaby, Excerptos Históricos
Lista de oficiais mortos e feridos no dia 13 de Dezembro de 1813 vinda do EM aliado - AHM 1-14-243-7 ms 1-2
Corpos do exército que combateram na batalha do Nive de 9 até 13 de Dezembro de 1813 – AHM 1-14-57-12 ms 1
Lista dos oficiais promovidos por boa conducta no campo de batalha – AHM 1-14-511-5 ms 1-13

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Francisco da Silveira, conde de Amarante, e o combate de Maya

(Fonte: Biblioteca Nacional Digital)
Na sequência da derrota sofrida na batalha de Vitoria (21 de Junho) os exércitos franceses que ocupavam o noroeste da Península Ibérica evacuaram toda aquela área numa retirada geral que terminou na fronteira hispano-francesa.

No dia 1 de Julho de 1813 praticamente todas essas forças se encontravam para lá da fronteira francesa e os seus comandantes procuravam reorganizá-las e reequipá-las com o objetivo de impedir a entrada do exército aliado em França, mas esse esperado ataque não estava nos planos imediatos de Wellington.

Depois de Vitoria, o comandante aliado pôs em marcha uma série de operações de perseguição dos vários corpos franceses em retirada, mas os resultados foram decepcionantes. Assim a 1 de Julho já Wellington tinha decidido que os seus objetivos se limitariam a estabelecer o seu exército desde o oceano até ao passo de Roncesvalles, a coberto do rio Bidassoa e ocupando os altos vales pirenáicos na fronteira com a França, e proceder ao cerco das praças de San Sebastian e Pamplona.

Enquanto no Norte as forças aliadas já se encontravam sobre o Bidassoa faltava ainda ocupar o estratégico vale de Bastan, situado na zona central da posição desejada por Wellington, o que facilitaria a comunicação entre os dois extremos dessa posição. Por ele passava também a estrada que ligava Pamplona a Bayonne pelo passo de Maya, uma das entradas em França pelos Pirinéus.

Para esta operação Wellington destacou uma força de vanguarda composta pela 2ª divisão aliada - duas brigadas britânicas e uma portuguesa comandadas pelo general William Stewart - e pela divisão portuguesa - comandada pelo general Francisco da Silveira, conde de Amarante - sob o comando do general Rowland Hill.

A 2 de Julho, Hill partiu de Pamplona pela estrada referida sendo apoiado sucessivamente por outras duas divisões do exército - a 7ª e a divisão ligeira - com um dia de marcha de intervalo entre todas.
Entretanto no vale de Bastan os franceses procediam à rendição do corpo comandado pelo general D’Erlon pelo comandado pelo general Gazan e foi nesse momento delicado que a vanguarda aliada entrou no vale.

(Vale de Baztan)
A 4 de Julho, Hill irrompeu pelo Bastan e empurrou as primeiras forças francesas que se lhe opuseram e Wellington, apesar de estar em inferioridade numérica - tinha entretanto destacado uma das brigadas da divisão portuguesa para Alduilles - decide atacar a posição inimiga de Aniz, no dia 5 de Julho. As forças francesas, bastante afetados moral e fisicamente pelas condições difíceis da recente retirada, abandonaram a posição perante a determinação aliada, tendo o general Gazan decidido evacuar o vale e estabelecer uma forte posição defensiva sobre o passo de Maya, porta de entrada em França.

(Foto retirada de The passes of the Pyrenees, p.166, de Charles L. Freston, 1912)
As forças aliadas concentram-se em Elisondo onde Wellington aguarda a aproximação da 7ª divisão para forçar a nova posição francesa. Assim, na manhã de 7 de Julho, o comandante aliado desencadeia o ataque enviando uma força comandada pelo general Stewart para assaltar a posição onde se ancorava a direita francesa esperando ao mesmo tempo que a 7ª divisão apoiasse este ataque. Quando Stewart expulsou os franceses da posição indicada, mandou avançar as restantes forças de Hill sobre o centro e a esquerda francesa.

É neste contexto que aqui apresenta-mos o relatório do General Francisco da Silveira, conde de Amarante, dando conta dos acontecimentos de 7 e 8 de Julho ao Marechal Beresford. Este documento de Silveira é extraordinário pois em nenhuma das narrativas britânicas consultadas é referido que o general português tivesse sido encarregado do comando da força que atacou o centro-esquerda francês.

As várias narrativas inglesas sobre os acontecimentos de 7 e 8 de Julho em Maya, são em geral pouco claras e contraditórias entre si. Assim, por exemplo, Charles Oman dá-nos uma versão completamente oposta à de Silveira mas também à de John Fortescue e especialmente à de John Hope, oficial do 92nd Regiment of Foot (Highlanders), que esteve presente no combate. A narrativa deste oficial é a mais detalhada e em grande parte concordante com a relação de Silveira que se publica, e pode ser encontrada nas suas cartas.

Transcrevemos a seguir o relatório de Silveira, conservado no Arquivo Histórico Militar, atualizando a ortografia e inserindo algumas notas:

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor

Tenho a honra de remeter a Vossa Excelência o mapa dos feridos que a brigada da divisão do meu comando [Divisão Portuguesa] teve nos combates do dia 7 e 8 do presente mês [Julho]. No dia 7 recebi ordem em Elizondo de tomar o comando da brigada inglesa nº 1 [1ª brigada da 2ª divisão aliada, comandada pelo coronel John Cameron] e do regimento de infantaria português nº 6, e do esquadrão de cavalaria do regimento nº 14 [14th Regiment Light Dragoons] para junto com a brigada portuguesa dos regimentos de infantaria nº 2 e 14 da divisão do meu comando, marchar sobre o inimigo que se achava em Arisco. O inimigo tinha uma grande guarda neste povo, sobre o caminho que a ele se dirige de Elizondo; na retaguarda de Arisco há um rio com uma ponte chamada de la Mearrita (?), no caminho que se dirige a Maia; o inimigo se achava postado na sua direita com algumas colunas mais afastadas, do qual saía uma linha até à sua esquerda apoiada na montanha onde tinham alguns batalhões em escalão. Na sua retaguarda a direito do povo de Maia em uma montanha tinha uma força considerável formada em colunas de escalão.
Todas estas posições foram deixadas imediatamente que a nossa tropa principiou a marchar; sendo por nós seguido muito de perto até que tomou posições no Porto de Maia; onde apoiou a sua direita em um cabeço mais elevado, e a sua esquerda até ao cimo da montanha que se eleva na esquerda do Porto, tendo guarnecido a subida da montanha com caçadores e pequenas partidas. Os caçadores britânicos, as companhias de granadeiros dos regimentos nº 2, 6 e 14 foram ocupadas no serviço de caçadores debaixo das ordens e direção do tenente-coronel Fitegerald [Fitzgerald] do regimento nº 60; os quais principiaram a fazer um fogo vivíssimo, e a levar diante de si os caçadores inimigos; então mandei subir pela direita o regimento de infantaria nº 6 com o regimento inglês nº 71 e pela esquerda os regimentos ingleses nº 50 e 92; os da direita tomaram posições no cimo de uma montanha que os inimigos tinham guarnecida e que dava já uma passagem para a em que estavam os inimigos em força; o fogo durou até às 8 horas da noite, e as tropas ficaram nas mesmas posições que tinham.
No dia 8 toda a montanha estava coberta de névoa e por isso não se tinha conhecimento dos movimentos do inimigo. Levantou-se a névoa e se viu que ele se retirava e então o Sr. General Hill [comandante do corpo que incluía a 2ª divisão aliada e a divisão portuguesa] mandou que fosse seguido; subiu-se à montanha sem oposição, onde se uniu a coluna, que marchava pela esquerda do comando do Sr. General Stuarth [general Stewart, comandante da 2ª divisão aliada]. Todos os caçadores, as companhias de granadeiros dos regimentos nº 2, 6 e 14 portugueses e regimento nº 6 seguiram o inimigo até ao fim da montanha, imediata ao povo de Urdaye [Urdax]; o inimigo se fez forte e na retaguarda deste povo tomou as montanhas da sua direita e esquerda deixando uma força na ponte que dirige o caminho a Anhóa [Ainhoué].
Três companhias do regimento nº 6 subiram acima da montanha da nossa direita e principiaram a fazer fogo aos caçadores inimigos. As companhias do regimento nº 2 e 14 tomaram as montanhas da nossa direita e principiaram a fazer fogo aos caçadores inimigos e algumas companhias de batalhão de caçadores nº 6 e do regimento de infantaria nº 6 e caçadores ingleses desalojaram o inimigo do povo de Urdaye onde se ficaram. Veio ordem para se suspender o fogo por cujo motivo tiveram os inimigos ocasião de tornarem a entrar no povo, de onde tornaram a ser desalojados pelo fogo de uma peça e um obus da brigada de calibre 6 do meu comando.
Permita-me V. E. que eu lhe segure, que toda a tropa que comandei cumpriu dignamente os seus deveres; mas não posso deixar com particularidade de fazer menção do tenente-coronel do regimento de infantaria 6 João Telles [de Meneses e Mello], que comandando as companhias de granadeiros se portou com muito valor; também merece os louvores de V. E. os oficiais que comandaram as companhias dos regimentos 2 e 14 e o major graduado em tenente-coronel Lourenço Martins [Pegado] que levou ao fogo o 2º batalhão do regimento nº 2 e o major Gill do regimento nº 6 que comandou as companhias do mesmo regimento que foram destacadas pela nossa direita, e o coronel Ashworth [Charles Ashworth], comandante da brigada 6 e 18, que vi junto com os caçadores fazendo fogo ao inimigo.
Falo nestes por serem dos regimentos portugueses porque se houvesse de falar dos mais o faria do digno modo e valor do Sr. Cameron, comandante da 1ª brigada inglesa, e do tenente-coronel Fitegerald doregimento nº 60, que comandou todos os caçadores e o fez muito dignamente. Todos os oficiais ingleses vi portar exemplarmente e tive a satisfação de ver que os portugueses o fariam igualmente.
Da brigada dos regimentos 4 e 10 e caçadores nº 10 nada posso dizer a V. E. pois desde que se apartou não tenho tido parte nenhuma, nem amais pequena notícia dela.
Deus guarde Vossa Excelência
Quartel-general de Arisco 9 de Julho de 1813.
Il.mo. Ex.mo Sr. Marquês de Campo Maior
De V. Ex.cia súbdito muito obediente
Assinatura: Conde de Amarante[1]

Nestes combates de 7 e 8 de Julho, em Maya e Urdax, as unidades portuguesas empenhadas tiveram 16 praças mortos, 2 oficiais e 47 praças feridos e ainda 3 praças extraviadas.
Os oficiais feridos foram o ajudante Joaquim Francisco de Sá e Vasconcellos e o Capitão João Schwalback, ambos no dia 7.

Bibliografia:
Sir Charles Oman, A History of the Peninsular War, volume VI.
James Hope, Letters from Portugal, Spain, and France…, by a British officer.
John Fortescue, A History of the British Army, volume IX.


[1] AHM-DIV-1-14-243-29 ms 16 a ms 21.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Voices from Vitoria: José Correia de Melo

«…had a horse wounded, who soon died, and my hat pierced; however, better that than the individual.»

Moisés Gaudêncio

Another personal account on the battle of Vitoria is that of major José Correia de Melo. This officer lead the 2nd battalion of the 11th Infantry Regiment into battle, which together with Infantry 23 and the 7th Caçadores Battalion, were the Portuguese brigade, commanded by colonel Thomas Stubbs, integral part of the allied 4th division.
José Correia de Melo, nephew of both marechal de campo (major general) José Correia de Melo and lieutenant general Florêncio José Correia de Melo, was only 26 years old in 1813, but already a veteran of the war in the Peninsula, having been present in the battles of Buçaco and of Salamanca, where he was severely wounded.

The Portuguese units in Stubb’s brigade distinguished themselves in Vitoria, having suffered considerable casualties while leading the advance of the allied 4th division in the attack of the center of the French position. These losses occurred mainly from the fire of the French artillery.
The Infantry regiments nº 11 and 23 were particularly praised by the commander of the Portuguese army, marshal William Beresford, in the Ordem do Dia (order of the day) of 1 July 1813.


(Battle of Vitoria, after William Heath)

José Correio de Melo kept a journal during the Peninsular campaigns, which Claudio de Chaby, Portuguese historian of the Peninsular War, was able to read and which he quoted frequently in his classic work Excerptos Históricos.
One of the excerpts quotes by Chaby is precisely the entry of 21 June, the day when the Battle of Vitoria was fought. It is this brief testimony we leave you:

«June, 21: Having Wellington made his reconnaissance of the position of the French army, commanded in person by the famous king Pepe [king Joseph], he ordered all divisions to motion early in the morning, in order to offer him an action; and so it came to be, having lasted the fight from eight in the morning till nine in the evening. Because of the great darkness, the enemy was not pursued beyond two leagues [1] from the city. The French left an immensity of baggage, much wealth, many prisoners, one hundred and fifty one artillery pieces, four hundred and eighty carriages, immense ammunition, at last, it’s incredible the defeat we inflicted on them! I commanded the second battalion of my regiment during the action, had a horse wounded, who soon died, and my hat pierced; however, better that than the individual.
I’ll report on what was told to me and what came to be: when king Pepe saw that lord Wellington was working on cutting his retreat, having occupied the royal chaussée of Bayonne, from a map he decided with his generals to retreat immediately by the track of Pamplona, the only one left to him; and so he took it taking with him only two pieces and a howitzer!»
[2]


Bibliography:
Claudio de Chaby, Excerptos Historicos e Collecção de Documentos relativos à Guerra denominada da Península…., 1863-1882.
Generais do Exército Português, coord. Coronel António José Pereira da Costa, 2008.
Mendo Castro Henriques, Vitoria e Pirinéus -1813- O exército português na libertação de Espanha, 2009.

Original Portuguese post here. Translation by Jorge Quinta-Nova.


[1] A league is an archaic unit of length, very common in Europe and Latin America. The Portuguese league is about 6 kilometers, and was much later substituted by the metric league (5 km).
[2] Excerptos Históricos e Collecção de Documentos relativos à Guerra denominada da Península… por Claudio de Chaby, volume 4, p. 707-708.

sábado, 28 de setembro de 2013

Documenta: The Battalion of Caçadores n.º 8 in the Battle of Vitoria

Moisés Gaudêncio

In the battle of Vitoria, the Portuguese Caçadores battalions were committed very intensely over the course of the day, always fighting in the vanguard of the allied columns. Seasoned by the campaigns of the previous three years, they showed great discipline and combat effectiveness, asserting themselves as the Portuguese units most respected by friends and feared by the enemy.


(Soldier from the 6th Caçadores, by Ribeiro Arthur)

We highlight the 8th Caçadores Battalion, one which suffered the most casualties in the battle of June 21, 1813, and that earned the public commendation of lord Wellington, allied commander in chief, in the dispatches he sent to the Portuguese and British governments.[1]

In Vitoria, the 8th Caçadores was commanded by Lieutenant Colonel Dudley St. Leger Hill, and was part of the Portuguese brigade commanded by brigadier William Spry, aggregate to the allied 5th Division, of General Oswald. This division was part of the allied corps which Wellington had detached to attack the right wing of the French line, backed in the Zamorra river, and to cut the road that connected Vitoria to France, the main line of retreat for the French. This corps, which formed the left wing of the allied army, was under the command of general sir Thomas Graham and was constituted by the two Portuguese independent brigades, the 1st and 5th divisions, Longa’s Spanish division and British artillery and cavalry.

To contextualize the action of the battalion we present an excerpt from the report sent by general Graham to Wellington after the battle:

«The enemy had a division of infantry, with some cavalry advanced on the great road, resting their right on some strong heights covering the village of Gamarra Maior. Both Gamarra and Abechuco, on the great road, were strongly occupied as têtes du pont to the bridges at these places over the Zadorra. Major-General Pack with his brigade of Portuguese infantry, and Colonel Longa with his Spanish corps, were directed to turn and gain these heights, supported by Major-General Anson’s brigade of Light Dragoons, and the 5th division of infantry, commanded by Major-General Oswald, who was requested to take charge of all these troops.
In the execution of this service the Portuguese and Spanish troops behaved admirably. The 4th battalion of Caçadores of General Pack’s brigade, and the 8th Caçadores of the 5th division, particularly distinguished themselves.»


(Bridge over the river Zadorra in Gamarra Mayor; early XX century photograph taken from here.)

We leave to lieutenant colonel Dudley St. Leger Hill the more detailed description of the action of his caçadores, in the report he sent to brigadier Spry, from the original in the Arquivo Histórico Militar, 1ª Divisão, 14ª Secção, Caixa nº 243, 18, ms 6 to 8.

Document: Report by lieutenant colonel Dudley St. Leger Hill to brigadier William Spry

June 22nd 1813

Sir

Being detached from your brigade in the action of yesterday I have the honor to report to you for the information of his Excellency Marshall Sir William Beresford that I was ordered by major general Oswald to place the 8th Caçadores under the imediate direction of Brigadier General Pack and in conjunction with the 4th Caçadores drive the enemy of the heights they occupied in front of the left column of the Army. This order was carried in to execution with the greatest promptitude and I cannot say sufficient in praise of the gallantry and forwardness of my men and officers. The heights we had to ascend were difficult of access and the fire of the enemy was very heavy yet did we succeed in driving the enemy from the different hills they successively occupy and obliged them to retire beyond the river [Zadorra].
The conduct of the battalion in pursuing the enemy afterwards on their retreat was no less conspicuous, having advanced in front of the various lines of columns of the army in conjunction with the 4th Caçadores driving before them the enemy numerous light troops of infantry and cavalry. As general Pack will of course make a report to his Excellency on the conduct of the troops engaged under his command I beg you will refer his Excellency to his Report and that you will have the goodness to mention in yours, your opinion of the conduct of the battalion in the first part of the engagement could not have escaped your observation.
The officers of the battalion behaved with the greatest gallantry and to recommend those who distinguished themselves would be to ?  the whole. I have however to beg you will report to his Excellency the extreme brave and gallant conduct of the sergeant major of the battalion who in all occasions during the day distinguished  himself by heading the advance of every company and exhibited the greatest coolness and judicious  arrangements in placing those intrusted to his command. The name of the sergeant major is Domingos Lopes, who has before been recommended for good conduct.

I have the honor to be sir your obeying servant
Dudley Hill Lieut- Colonel 8 Caçadores

Note 1: It is possible to consult the map of the battle of Vitoria in the website Napoleon Series.



[1] The Dispatches of Field Marshall The Duke of Wellington (…) Volume The Tenth, 1838, p. 449.
[2] Supplementary Despatches, Correspondence and Memoranda of Fiel Marshall Arthur Duke of Wellington (…) Volume The Eight. 1861, p. 7.

(Jorge Quinta-Nova, translation)
Original Portuguese text in url

domingo, 22 de setembro de 2013

Documenta: O Batalhão de Caçadores nº 8 na Batalha de Vitoria

Na batalha de Vitoria os batalhões de caçadores portugueses foram empenhados de forma intensa ao longo do dia, combatendo sempre na vanguarda das colunas aliadas. Temperados nas campanhas dos três anos anteriores, exibiram grande disciplina e eficácia em combate, afirmando-se como as unidades portuguesas mais respeitadas pelos amigos e mais temidas pelo inimigo.


(Soldado de Caçadores nº 6, 1811, por Ribeiro Arthur)

Destacamos o batalhão de caçadores nº 8, um dos que maiores perdas sofreu na batalha de 21 de Junho de 1813, e que mereceu o louvor público de lord Wellington, comandante em chefe aliado, nos despachos que enviou para os governos português e britânico.[1]

Em Vitoria, o batalhão de caçadores nº 8 foi comandado pelo tenente-coronel Dudley St. Leger Hill, e fazia parte da brigada portuguesa comandada pelo brigadeiro William Spry, agregada à 5ª divisão aliada, do general Oswald. Esta divisão fazia parte do corpo aliado que Wellington tinha destacado para atacar a ala direita do dispositivo francês, apoiada no rio Zadorra, e cortar a estrada que ligava Vitoria a França, a principal linha de retirada francesa. Este corpo, que constituía a ala esquerda do exército aliado, estava sob o comando do general sir Thomas Graham e era formada pelas duas brigadas portuguesas independentes, a 1ª e a 5ª divisões, a divisão espanhola de Longa e artilharia e cavalaria britânicas.

Para contextualizar a ação do batalhão apresentamos a tradução de um excerto do relatório enviado pelo general Graham a Wellington depois da batalha:

«O inimigo tinha uma divisão de infantaria, com alguma cavalaria avançada, disposta sobre a estrada principal, apoiando a direita sobre umas alturas de difícil acesso, cobrindo a povoação de Gamarra Maior. Tanto Gamarra como Abechuco, esta na estrada principal, estavam fortemente ocupadas pelo inimigo como testas-de-ponte para as pontes que nelas atravessam o Zadorra. Foi ordenado ao General Pack, com a sua brigada de infantaria portuguesa e ao coronel Longa com o seu corpo espanhol, que flanqueassem e ocupassem aquelas alturas, apoiados pela brigada de dragões ligeiros do General Anson e pela 5ª divisão comandada pelo General Oswald, ao qual foi atribuído o comando geral sobre todas estas tropas. Na execução deste serviço as tropas portuguesas e espanholas comportaram-se admiravelmente. O 4º batalhão de Caçadores da  brigada do general Pack e o 8º de Caçadores da 5ª divisão distinguiram-se particularmente.»[2]


(Ponte sobre o Rio Zadorra em Gamarra Mayor; fotografia do inicio do século XX. Retirada daqui.)

Deixamos ao tenente-coronel Dudley St. Leger Hill a descrição mais detalhada da ação dos seus caçadores, que consta no relatório que enviou ao brigadeiro Spry e que traduzi-mos a partir do original conservado no Arquivo Histórico Militar, 1ª Divisão, 14ª Secção, Caixa nº 243, 18, ms 6 a 8.

Documento: Tradução do relatório do tenente-coronel Dudley St. Leger Hill para o Brigadeiro William Spry

Para o brigadeiro-general Spry

22 de Junho de 1813

Senhor
Tendo sido destacado da sua brigada durante a ação de ontem tenho a honra de lhe comunicar, para informação de sua Excelência o Marechal Sir William Beresford, que recebi ordem do major-general Oswald para colocar o 8º de Caçadores sob o comando imediato do brigadeiro-general Pack e, em combinação com o 4º de Caçadores, expulsar o inimigo das alturas por ele ocupadas na frente da coluna da esquerda do Exército.
Esta ordem foi executada com a maior prontidão e eu não posso dizer o suficiente em louvor da galhardia e desenvoltura dos meus soldados e oficiais. As alturas a que tivemos de ascender eram de difícil acesso e o fogo do inimigo bastante intenso mas mesmo assim nós conseguimos ir expulsando o inimigo das várias colinas que ele foi ocupando sucessivamente e obrigando-o a retirar para lá do rio [Zadorra].
O comportamento do batalhão na subsequente perseguição feita ao inimigo após a retirada referida foi também digno de nota, tendo avançado na vanguarda das várias linhas de colunas do Exército em combinação com o 4º de Caçadores empurrando à sua frente as numerosas tropas ligeiras inimigas de infantaria e de cavalaria.
Como o general Pack irá certamente informar sua Excelência [Beresford] sobre a conduta das tropas empregues sob o seu comando peço-lhe que chame a atenção a sua Excelência [Beresford] para o relatório do general e também que no seu tenha a bondade de mencionar a sua opinião sobre o comportamento do batalhão no inicio da ação, o qual não deve ter escapado à sua observação.
Os oficiais do batalhão comportaram-se com grande bravura e recomendar aqueles que se distinguiram seria injusto para todos. Tenho, no entanto, de lhe pedir que informe sua Excelência da brava e destemida conduta do sargento-ajudante do batalhão, o qual, em várias ocasiões durante o dia se distinguiu, dirigindo o avanço das companhias exibindo grande sangue frio e procedendo de forma judiciosa na colocação dos soldados que lhe foram confiados. O nome do sargento-ajudante é Domingos Lopes e já tinha sido recomendado anteriormente pela sua boa conduta.

Tenho a honra de ser o seu mais obediente criado

Dudley Hill Tenente-Coronel 8º Caçadores

Nota 1: No site Napoleon Series é possível consultar um mapa da batalha de Vitoria.

Nota 2: As traduções são de Moisés Gaudêncio.


[1] The Dispatches of Field Marshall The Duke of Wellington (…) Volume The Tenth, 1838, p. 449.
[2] Supplementary Despatches, Correspondence and Memoranda of Fiel Marshall Arthur Duke of Wellington (…) Volume The Eight. 1861, p. 7.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Voices from Vitoria: José Jorge Loureiro

José Jorge Loureiro, a Portuguese officer in the battle of Vitoria

Moisés Gaudêncio

«All were maneuvers and skirmishers»

In the campaign which started in May 1813, and which would lead the Anglo-Portuguese army to the borders of France, José Jorge Loureiro was an alferes (ensign) of the Infantry Regiment n.º 4 and aid de camp to the British brigadier, on the service of Portugal, Archibald Campbell, and it was as such that he was present in the decisive battle of Vitoria, fought in June 21, 1813.

Brigadier Campbell commanded the Portuguese brigade made up of the Infantry Regiments n.º 4 and 10 and by the Caçadores Battalion n.º 10, part of the Portuguese Division commanded by General Francisco da Silveira, Count of Amarante.

The Portuguese Division was part of the corps commanded by general Rowland Hill, which constituted the right wing of the allied army.
Campbell’s brigade stood throughout the battle in reserve in the right wing of the allied line.

During this period of his life, Loureiro kept correspondence with his brother-in-law and friend Ernesto Biester, and it’s precisely in one of those letters that Loureiro gives his account of the events of Vitoria. It was originally published by Mendes Leal Junior in the Revista Contemporânea de Portugal e Brazil, segundo ano, april 1860, I, Lisboa, p. 100 ff.

We transcribe, with modern orthography, this rare eyewitness testimony of a Portuguese officer.

Field next to Salvaterra, June 23, 1813

Dear Ernesto

I hurry in reporting to you the events of the 21st instant, the most glorious day that until now the allied armies have had. As you should want to know what happened, I will tell you what I have witnessed, and what I have heard after.

On the 21st all the army advanced from the banks of the Bayas in different columns on Vitoria. General Hill’s corps was the right of all the army, and as it had less to march, it was the first to encounter the left of the enemy, which was on a mountain, and made an oblique line with the right covering Vitoria. On other mountains, next to the royal road of Bayonne the whole enemy army was in position. It had, to the front of its left, dense woods, which it wanted to dispute with the caçadores. As soon as we arrived, the attack began with an English brigade, and my division as reserve. The other brigades slowly climbed a steep mountain in order to flank the enemy.

As the rest of the army hadn’t yet arrived to the established points, our attack was much delayed and a demonstration. The French, with courage and success, defended the woods only with skirmishers, supported by some artillery on the road, which did us no damage. The attack went on like this for two hours, until General Graham, having flanked the enemy on our left, began also his own attack. Then the general action came about. The French, who expected the full attack on their left, seeing themselves flanked, began retreating their right in much confusion.

At this time, our right had already advanced too much on the mountain, and the enemy seeing their left almost being equally flanked, began also with much hast and confusion their own retreat. My brigade, who protected the English brigade who made the attack, marched in reach of the French, as did all the army. As the field was all cultivated and with many ditches, to mark the lands and wash way the mountain waters, we could never go with the necessary speed; and they took advantage of the order by which we marched, to flee and regroup at another point. The field was so much to their advantage, which presented at each point small positions, from where they were dislodged by skirmishers, and maneuvers, with which they were always in danger of being cut off by both flanks. The chase lasted all day till dark night and in the space of two [Portuguese] leagues and a half, counting from where the action began. They left open the Bayonne road, and retreated on the Pamplona royal road, where we are today on their trail. They lost 105 artillery pieces with all its equipment, and more than 2000 baggage carts, almost all of the army. King Joseph lost all its own baggage inside Vitoria, as well as 24 servants. Only the horses escaped by hand. We made from 700 to 800 prisoners, and 180 officers. General Sourry and Grenier dead and 2 prisoners (I ignore their names). Our soldiers are filled with riches from the plunder. Our loss in dead and injured is greater than that of the enemy; however the wounded are all slightly so. There is no general of ours injured. The way the enemy retreated is quite shameful. The position they took, and the way by which they allowed themselves to be flanked gives no credit to their generals. My brigade, though it didn’t fire, did no small service, as it marched with incredible speed, threatened always very close the enemy’s left.
 
We march for 23 days without halting, and I believe we shall not do it before going to Pamplona.
 
The action began at 11 am, became general by two, and ended at night.
There was no regular attack. All were maneuvers and skirmishing.

Goodbye Friend

Loureiro

(Jorge Quinta-Nova, translation)
Original Portuguese text in url